ENCONTROS, DESENCONTROS, REFLEXÕES....

ENCONTROS, DESENCONTROS, REFLEXÕES....
"And they actually believed it all!"

quinta-feira, 7 de abril de 2011

CRIAMOS NOSSOS MONSTROS.



Entre 1816 e 1817, uma jovem inglesa dramaturga, ensaísta, biógrafa e escritora de literatura de viagens de 19 anos, Mary Wollstonecraft Shelley, escreveu sua mais famosa novela gótica: Frankenstein ou o Moderno Prometeu (Frankenstein: or the Modern Prometheus), mais conhecido simplesmente por Frankenstein.
Com inspirações do movimento romântico, o romance relata a história de Victor Frankenstein, um universitário que, após debruçar-se por muito tempo sobre os estudos das ciências naturais, acaba encontrando o segredo da geração da vida. Constrói um monstro em seu laboratório. Posteriormente, suspeita que sua criatura é responsável por crimes ocorridos na região, e sente-se profundamente culpado por isso. O monstro exige de seu criador, que lhe construa uma fêmea, prometendo por sua vez deixar a humanidade em paz e ir viver com a sua noiva nas selvas sul-americanas.
O romance obteve grande sucesso e gerou todo um novo gênero de horror, tendo grande influência na literatura e cultura popular ocidental.
Porque trago à lembrança tal estória?
Pelo simples fato de achar que essa alegoria guarda grande semelhença com nossa realidade atual.
Ontem, mais um crime foi cometido na Zona Leste de Manaus, envolvendo um adolescente, um músico. Alciney Pereira Gomes, de 19 anos, matou, à noite, sua própria mãe, seu irmão de 13 anos, e depois atentou contra a vida do próprio pai, também ferido à golpes de faca, e com um golpe na cabeça causado por um pé de cabra.
Hoje, foi a vez do Rio de Janeiro. Wellington Menezes de Oliveira, um homem de 23 anos, abriu fogo em uma escola Municipal de realengo, ceifando a vida de onze crianças, e deixando vinte e dois feridos .
Mas o que motivou essas pessoas a cometerem homicídios dessa natureza?
De um lado um músico, de quem esperávamos atitudes e valores mais elevados, uma vida contempativa, uma sensibilidade mais apurada. De outro, um jovem, possivelmente portador do vírus HIV, que entrou em uma escola, sob a alegação de que iria proferir uma palestra.
A conduta humana às vezes está permeada de impresivilidades. Para a ciência psicológica, o ser humano possui suas quatro dimensões básicas em sua formação: a Biológica, a Psíquica, a Social e, mais atualmente explorada, a Religiosa. Todas interagindo entre si, e formando o ser em sua integralidade.
E para a clínica psi, não podemos perder a capacidade de nos surpreendermos com essas condutas, pois estamos sujeitos às "intempéries" causadas por nossas angústias.
E o que gera essas angústias. De onde surgem. Surgem de nosso processo de desenvolvimento psicossexual e psicossocial, por assim dizer. Fantasiamos o mais que podemos, recorremos aos mais diferentes modos de lidarmos com elas, mas para alguns o fardo é pesado demais. Não se dá mais conta. Os Filmes hollywoodianos violentos que costumamos assistir, por exemplo, não mais ajudam a sublimar nossos desejos mais sádicos. E pronto, faz-se a passagem ao ato. Cometem-se as barbaridades mais bestiais.
E quem são os verdadeiros responsáveis?
Na novela de Shelley, o Criador do Monstro, Dr. Frankestein, vive atormentado pela culpa, e nós, enquanto sociedade? Será que nos perguntamos onde foi que falhamos? Onde poderíamos ter sido melhores? O que poderíamos ter feito para contribuírmos de forma consistente, para promover uma melhor formação desse ser social ou sociável? Ou preferimos nos apequenar diante de nossas responsabilidades e das conjuturas político-econômicas em uma posição passiva e acomodada, enchendo de grades nossas residências, assistindo tudo como meros espectadores, e como se isso não tivesse nada a ver conosco.
Apressamo-nos em julgar e condenar tais atos.
Mas é necessário, mais do que nunca, fazermos uma análise crítica e profunda de nossa sociedade. Quem sabe se ao longo do tempo, nós e nossas elites tenhamos promivido a criação desses "frankesteins", que a exemplo da novela de Shelley, tem seus corações e cérebros defeituosos, provenientes de décadas de descaso com sua formação, como verdadeiros e saudáveis cidadãos brasileiros. O que está em questão aqui, não é só o(s) ato(s) violento(s) promovido(s) por esses sujeitos, isoladamente. Mas a forma manifesta de lidar com essa agressividade.
O Monstro de Shalley ao fugir do laboratório de Frankenstein para uma floresta próxima, aprendeu a comer frutas e vegetais, e a usar o fogo. Porém, ao encontrar seres humanos era sempre escorraçado e agredido. Então, eventualmente, esconde-se no depósito de lenha anexo a uma cabana. Lá, observa através de frestas na parede a vida de uma família pobre de ex-nobres, afeiçoa-se a eles e ajuda-os em segredo. Aprende a língua e a escrita e encontra livros onde aprende sobre a vida e a virtude. Na idéia da escritora, uma jovem adolescente, em sua visão romântica, até aquela aberração monstruosa possuía a capacidade de regeneração.
E nós? Podemos ser românticos a este nível, de acreditarmos no ser humano? Em reforma de caráter? Em paz no convívio social? Em uma vida de virtudes livre de crimes, violências e desigualdades sociais? No bem comum?
Minha resposta eu penso que tenho.
Me considero sim, um romântico, por acreditar em tudo isso.
E você que me está lendo agora, Já tem a sua?



2 comentários:

  1. Não só criamos os monstrons mas os alimentamos diariamente, o pior é que este processo nem sempre é consciente.

    ResponderExcluir